Cuidar de Você

Cuidar de você


Quando alguém de fora não entende nosso amor, brinco que você é quem me puxa pelo tornozelo quando o caos da cidade parece querer me engolir. Ou mando buscar aquela foto bacana que fiz de você com cara de quem não tem nada a ver com minha paz. Ou peço pra voltar ao maio que cedi meu suéter marrom e fiquei na maior pompa, segurando no osso o frio desgraçado. Ali, sem querer, predisse: vou cuidar de você.


Gosto disso, parece que finalmente sei fazer como ninguém algo nesta vida. Faço questão de estar de plantão naquele santo lugar, se num dia cheio de ambulâncias, buzinaços, marmita, cordões de isolamento, betoneiras e esporros desenrolam um fio de impaciência no teu dia, se a usual alegria recolhe a mão, se a tristeza vira um pedacinho teu. (...)


Ao chegar mais ou menos pelas dez e meia da noite, quando terminam as luzes do prédio, quando paira a brisa outonal, quando já compensei todas as merdas do mundo fazendo tudo ou qualquer coisa por você, é a hora que a gente se basta, se encontra sem saber que braço é de quem, pra finalizar o dia com algum aconchego, algum prazer.


Ali renovo outra vez que sempre estarei lá, aqui, do lado da calçada onde passam rasantes os carros, abrindo a lata de atum, medindo gotas de tylenol na colher de sopa. Mas sem palavras, só com os lábios mornos procurando tua nuca no escuro dizendo que vou cuidar de você. Aí, minutos antes de você tapar os olhos de mel e recolher o último sorriso, pergunto o que seria do nosso amor se a gente não fosse tão diferente dos que não regam a rotina de poesia e chá de maçã.


As horas passam e parece até que o sol da manhã sabe que acordei do seu lado, antes de você, sem saber que braço era o meu, que fiquei um tempinho te olhando dormir de boca aberta feito nenê, antes de recomeçar todo sacrilégio com um "vem amor, tá na hora de acordar".



Gabriel Nunes - carascomoeu


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