“Sou forte. Meio doce e meio ácida. Em alguns dias acho que
sou fraca. E boba. Preciso de um lugar onde enfiar a cara pra esconder as
lágrimas. Aí penso que não sou tão forte assim e começo a olhar pra mim. Sou
forte sim, mas também choro. Sou gente. Sou humana. Sou manhosa. Sou assim.
Quero que as coisas aconteçam já, logo, de uma vez. Quero que meus erros não me
impeçam de continuar olhando para a frente. E quero continuar errando, pois
jamais serei perfeita (ainda bem!). Tampouco quero ser comum e normal. Quero
ser simplesmente eu. Quero rir, sorrir e chorar. Sentir friozinho na barriga,
nó no peito, tremedeira nas pernas. Sentir que as coisas funcionam e que tenho
que trocar de jeito quando insisto em algo que não dá resultado. Quero aprender
e, ainda assim, continuar criança. Ficar no sol e sentir o vento gelado no
nariz. Quero sentir cheiro de grama cortada e café passado. Cheiro de chuva, de
flor, cheiro de vida. Aprecio as coisas simples e quero continuar
descomplicando o que parece complicado. Se der pra resolver, vamos lá! Se não
dá, deixa pra lá. A vida não é complicada e nem difícil, tudo depende de como a
gente encara e se impõe. Quero ser eu, com minha cara azeda e absurdamente
açucarada. Não quero saber tudo e nem ser racional. Quero continuar mantendo o
meu cérebro no lugar onde ele se encontra: meu coração. E essa é a melhor parte
de mim.”
Ah, e dizer que isto vai acabar, que por si mesmo não pode durar. Não, ela não está se referindo ao fogo, refere-se ao que sente. O que sente nunca dura, o que sente sempre acaba, e pode nunca mais voltar. Encarniça-se então sobre o momento, come-lhe o fogo, e o fogo doce arde, arde, flameja. Então, ela que sabe que tudo vai acabar, pega a mão livre do homem, e ao prendê-la nas suas, ela doce arde, arde, flameja. Clarice Lispector
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