Ei menina, te vi esses dias, passeando pelas vidraças. Que
sorriso é este que fazia tempo que não via? Tenho percebido que mudaste... que
sua vida anda se transformando. Notei que seu coração está mais sublime, mais
leve, que se libertou. Percebi menina, que uma nova fase apontou lá na frente,
que tudo que você sempre se prendeu, desabou, perdeu tudo, que as estruturas
foram afundadas e que você cresceu com isso. Cresceu de tal maneira que esse
sorriso fazia muito tempo que não aparecia, onde foi que ele tinha se perdido?
Foi muito bom ver ele novamente. Senti uma leveza em seu caminhar, senti que
essa fase é um momento que seu coração esperava. Pelo que me parece, nada está
concreto, mas acreditar passou a fazer parte de seu dia a dia. Acreditar,
acreditar. Que esse novo tempo nos traga
amadurecimento e convencimento, pois naquela vidraça vi algo mudar, vi algo
bonito acontecendo, vi que algo mudou em você e em mim também, talvez porque já
não sei se é você ou eu nesse vidro.
Ah, e dizer que isto vai acabar, que por si mesmo não pode durar. Não, ela não está se referindo ao fogo, refere-se ao que sente. O que sente nunca dura, o que sente sempre acaba, e pode nunca mais voltar. Encarniça-se então sobre o momento, come-lhe o fogo, e o fogo doce arde, arde, flameja. Então, ela que sabe que tudo vai acabar, pega a mão livre do homem, e ao prendê-la nas suas, ela doce arde, arde, flameja. Clarice Lispector
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